A morte de Sofia
"Pensava secretamente que tudo não havia passado de um mal entendido. Minha genética familiar era tão forte e perfeita que, obviamente, minha filha sairia daquela muito bem e rápido. Eu não sabia de nenhuma previsão futura, nem sabia quando seriam as cirurgias. Não sabia como seria a vida dela, não sabia qual dos sentimentos contidos dentro de mim seria mais útil para nós duas. E, sem saber que caminho tomar, optei pelo único sentimento possível e que nunca seria demais sentir: o amor incondicional.
O tempo não passava e meu estômago estava enrijecido. Enquanto eu e meu marido Luís caminhávamos pelas ruas próximas da maternidade, eu via as pessoas almoçando, sorrindo, caminhando com pressa.
[...]
A UTI é o lugar mais horrível para se estar. É um lugar que testa violentamente os limites humanos daqueles que a habitam diariamente, minuto a minuto. Ali são testados pai, mães e médicos, mesmo os mais experientes. É muito difícil ter um filho internado na UTI. São momentos solitários, nos quais é preciso não só aprender a lidar com os próprios limites, com a própria impotência e com o próprio egoísmo, mas também tentar determinar sinceramente até onde ir. É conviver com o medo 24 horas por dia. É sentir o coração disparando cada vez que se chega e só senti-lo bater ritmado depois de pousar os olhos no bebe e ter a certeza de que está tudo bem. Medo da perda, medo da piora, medo do futuro incerto, medo do presente. Medo da própria capacidade de suportar as notícias.
[...]
Voei para a UTI, que estava em festa. Às 15:30 do dia 09 de Maio de 2002, um ano e um mês depois do nascimento, enfim a chegada em casa. Enquanto entrava pela porta, agarrada à criança, chorava e repetia: "Não acredito!". Eu me sentia mãe de verdade, após mais de um ano de espera: como era bom poder acordar no meio da noite e ir beijá-la, dar seu banho dentro do quarto e não mais na UTI, cantar para ela segurando-a em meus braços.
[...]
Voltei para casa arrasada, parecia que carregava um piano nas costas.
[...]
Num ato de respeito, toda a equipe se retirou e foi pra trás de um vidro, onde fica o monitor central. Meu marido se levantou e saiu. Ela, fria, nos meus braços, não estava mais lá; eu simplesmente não a sentia. Como um pássaro leve, tinha voado, sem barulho, sem alarde. Passou para algum lugar e a porta se fechou, deixando-me aqui sozinha."
texto retirado do livro 'O Mistério das Bolas de Gude' de Gilberto Dimenstein
O tempo não passava e meu estômago estava enrijecido. Enquanto eu e meu marido Luís caminhávamos pelas ruas próximas da maternidade, eu via as pessoas almoçando, sorrindo, caminhando com pressa.
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A UTI é o lugar mais horrível para se estar. É um lugar que testa violentamente os limites humanos daqueles que a habitam diariamente, minuto a minuto. Ali são testados pai, mães e médicos, mesmo os mais experientes. É muito difícil ter um filho internado na UTI. São momentos solitários, nos quais é preciso não só aprender a lidar com os próprios limites, com a própria impotência e com o próprio egoísmo, mas também tentar determinar sinceramente até onde ir. É conviver com o medo 24 horas por dia. É sentir o coração disparando cada vez que se chega e só senti-lo bater ritmado depois de pousar os olhos no bebe e ter a certeza de que está tudo bem. Medo da perda, medo da piora, medo do futuro incerto, medo do presente. Medo da própria capacidade de suportar as notícias.
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Voei para a UTI, que estava em festa. Às 15:30 do dia 09 de Maio de 2002, um ano e um mês depois do nascimento, enfim a chegada em casa. Enquanto entrava pela porta, agarrada à criança, chorava e repetia: "Não acredito!". Eu me sentia mãe de verdade, após mais de um ano de espera: como era bom poder acordar no meio da noite e ir beijá-la, dar seu banho dentro do quarto e não mais na UTI, cantar para ela segurando-a em meus braços.
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Voltei para casa arrasada, parecia que carregava um piano nas costas.
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Num ato de respeito, toda a equipe se retirou e foi pra trás de um vidro, onde fica o monitor central. Meu marido se levantou e saiu. Ela, fria, nos meus braços, não estava mais lá; eu simplesmente não a sentia. Como um pássaro leve, tinha voado, sem barulho, sem alarde. Passou para algum lugar e a porta se fechou, deixando-me aqui sozinha."
texto retirado do livro 'O Mistério das Bolas de Gude' de Gilberto Dimenstein
7 Comments:
Ai, gente, que triste, não sei se vou comprar esse livro não...
By Anônimo, at terça-feira, 14 março, 2006
ele é foda...
By Unknown, at terça-feira, 14 março, 2006
Fabuloso, hein!? Gostei principalmente da parte que diz sobre a UTI 'É sentir o coração disparando cada vez que se chega e só senti-lo bater ritmado depois de pousar os olhos no bebe e ter a certeza de que está tudo bem'. Pra nós médicos (plantonistas) tb é assim!!!
By Anônimo, at terça-feira, 14 março, 2006
Ai...que triste amiga...acho que não tô numa fase de ler um livro triste assim. Na verdade, acho que nunca estive nessa fase...
By Anônimo, at terça-feira, 14 março, 2006
só hoje consegui entrar aqui. estava dando erro. agora, queria saber p q a sra. ñ deu a honra a tua presença sábado? acho q estou de mal de vc.
By Anônimo, at quinta-feira, 16 março, 2006
so sad... too depressive...
By drikosa, at quinta-feira, 16 março, 2006
entrei aqui lá pelo noitepassada, gostei do seu blog e dos textos, qto o texto ai, é bem triste, mas parece ser um bom livro, boa indicação....
By André Gabriel, at sábado, 18 março, 2006
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